Quando falamos em Imposto de Renda -IR no Brasil, podemos imaginar que esse imposto sempre existiu, isto é, que existe desde o descobrimento do país pelos navegadores portugueses.
No entanto, a história do Imposto de Renda no Brasil é relativamente recente, remontando ao início do século XX. A seguir abordarei um pouco da origem do imposto para pessoas físicas, suas primeiras alíquotas e faixas de isenção, os contribuintes no momento da sua criação, entre outros pontos.
A primeira lei do Imposto de Renda no Brasil (pessoa física)
O marco legal que instituiu o Imposto de Renda sobre rendimentos de pessoas físicas no Brasil foi a Lei n.º 4.625, de 31 de dezembro de 1922[1]. Embora antes disso houvesse tentativas de tributar renda ou lucros de maneira fragmentada, foi essa lei que consolidou a ideia de um “imposto geral sobre a renda” no país.
Diante da complexidade do imposto e da sua novidade, o imposto de renda começou a ser efetivamente exigível em 1924, mais precisamente a partir do Decreto nº 16.581, de 4 de setembro de 1924.
Importante destacar que naquela época se tributava, através do imposto de renda, os rendimentos produzidos no território nacional[2], aplicando-se o princípio da territorialidade. Atualmente, brasileiros com residência fiscal também têm os seus rendimentos auferidos no estrangeiro tributados pelo imposto de renda.
É a partir da lei acima mencionada que se inicia a cobrança do IR em território brasileiro.
A partir de qual renda a pessoa física era obrigada a pagar?
De acordo com o Decreto nº 16.581/1924, apenas os contribuintes com rendimentos anuais acima de determinado valor em “Réis” — moeda em circulação na época — estavam sujeitos ao imposto. Era isentos do imposto de renda aqueles cuja renda anual não ultrapassasse 10 contos de Réis (10:000$).
Para se ter uma ideia do que isso significava, um “conto de réis” representava 1.000.000 (um milhão) de réis. Portanto, o contribuinte só passava a pagar o imposto se recebesse mais do que 10.000.000 de Réis ao ano.
As primeiras alíquotas do Imposto de Renda
A lei de 1922 estabeleceu um sistema progressivo de alíquotas que variava de 0,5% a 8% sobre a renda anual que ultrapassasse a faixa de isenção.
Hoje, após a faixa de isenção, as alíquotas variam de 7,5% a 27,5%.
Faixa de isenção na criação do IR no Brasil e valor atualizado
Quando instituído o IR no Brasil, a faixa de isenção equivalia à renda anual de até dez contos de Réis (10:000$000).
A mesma dúvida que eu tive você deve ter tido também, caro leitor. Quanto será que valeria dez contos de Réis hoje?
Fazer a conversão exata é extremamente complexo, pois o Brasil passou por diversas alterações monetárias (mil-réis, cruzeiro, cruzado, real etc.) e períodos de hiperinflação ao longo do século XX, em especial na década de 1980. Além disso, a simples correção inflacionária não captura mudanças estruturais de poder de compra das moedas.
Contudo, estudos acadêmicos e estimativas baseadas em índices de inflação e comparações de poder aquisitivo sugerem que 10 contos de réis em 1923 poderiam equivaler, em valores de poder de compra atual, a R$ 353.000,00 (trezentos e cinquenta e três mil Reais) em valores atuais, dependendo do método de cálculo.
Em resumo, ainda que não exista um consenso absoluto, fica claro que se tratava de uma renda muito elevada para os padrões da época, tornando o Imposto de Renda algo restrito a uma pequena parcela da população.
Hoje, o imposto de renda incide sobre rendas mensais superiores a R$ 1.903,98 (um mil, novecentos e três Reais e noventa e oito centavos). Isso significa que quem recebe R$ 385,99 (trezentos e oitenta e cinco Reais e noventa e nove centavos) a mais do que o salário mínimo nacional de R$ 1.518,00 (um mil, quinhentos e dezoito Reais), já é contribuinte do imposto de renda, com alíquota de 7,5% (de R$ 1.903,99 até R$ 2.826,65).
Se dolarizarmos isso, tomando a cotação do dólar americano em 04/02/2025 em relação ao Real brasileiro (US$ 1,00 = R$ 5,77), quem tiver renda acima US$ 329,97 (trezentos e vinte e nove dólares e noventa e sete centavos) no Brasil já é contribuindo do imposto de renda.
Essa faixa de isenção é irrisória, colocando mais pessoas como contribuintes do imposto de renda, desvirtuando o intento inicial da lei instituidora do referido imposto.
As alíquotas atuais do Imposto de Renda (pessoa física)
Hoje, mais de um século depois, a legislação do Imposto de Renda é bem mais complexa e detalhada, constantemente atualizada por decretos, leis e instruções normativas da Receita Federal.
Atualmente (até a data deste texto), as faixas de incidência mensal para pessoa física são:
- Isento: até R$ 1.903,98
- 7,5%: de R$ 1.903,99 até R$ 2.826,65
- 15%: de R$ 2.826,66 até R$ 3.751,05
- 22,5%: de R$ 3.751,06 até R$ 4.664,68
- 27,5%: acima de R$ 4.664,68
Imposto de renda pensado para “grandes fortunas”
O imposto de renda, quando instituído no Brasil em 1922, através da Lei nº 4.625/1922, não visava alcançar as rendas médias ou baixas, mas sim as pessoas com rendas consideradas altas, o que ultimamente se convencionou chamar de grandes fortunas.
A faixa de isenção no início era para pessoas que auferiam rendimentos anuais de até 10 contos de Réis, ou seja, 10 milhões de Réis, que era um valor bastante elevado, conforme visto acima, e apenas uma pequena parcela da população atingia essa faixa de renda.
Desde 1922 o Brasil passou por oito mudanças de moedas e o valor da isenção do imposto de renda não acompanhou a ideia inicial de tributar apenas as grandes rendas, passando a infligir pessoas que recebem, mensalmente, a módica quantia de R$ 1.903,99 (um mil, novecentos e três Reais e noventa e nove centavos), o que equivale a uma renda anual de R$ 22.847,88 (vinte e dois mil, oitocentos e quarenta e sete Reais e oitenta e oito centavos), muito distante do valor correspondente a 10 contos de Réis. Isto é, o que foi inicialmente pensado para alcançar altas rendas, atualmente alcança pessoas com baixo rendimento, retirando da disponibilidade do trabalhador mais humilde e da classe média o pouco que ele aufere com o trabalho.
Conclusão
O Imposto de Renda no Brasil tem uma história longa e cheia de nuances, iniciada oficialmente com a Lei n.º 4.625/1922, que estabeleceu um modelo incipiente de progressividade, alíquotas entre 0,5% a 8% e uma faixa de isenção alta para os padrões da época (10 contos de Réis anuais).
Desde então, ele se tornou um dos principais tributos federais, sofrendo diversas mudanças ao longo do tempo, sendo a principal mudança a ampliação do espectro tributário, que passou de um imposto pensado para tributar grandes fortunas para tributar grande parcela da população, bastando, para se tornar contribuinte do imposto de renda pessoa física, perceber mensalmente a partir de R$ 1.903,99 (um mil, novecentos e três Reais e noventa e nove centavos).
As lições que se pode tirar da instituição do imposto de renda no Brasil são as seguintes:
- uma vez criado o imposto (ou qualquer tipo de tributo), esse existirá praticamente para sempre porque o Estado e os governantes passam a formatar a estrutura estatal tendo como base financeira mínima o resultado da arrecadação, nunca cogitando diminuir o tamanho do Estado;
- a pretensão inicialmente adotada (no caso do IR, de tributar grandes rendimentos) perde-se ao longo do tempo, passando a ser um risco futuro para pessoas que inicialmente não são contribuintes daquele imposto, pois, por uma omissão deliberada do ente tributante em momento posterior, a exemplo da não correção adequada da faixa de isenção para preservar o intento inicial da norma tributária, aumenta-se a base de contribuintes, obrigando quem inicialmente não era o público alvo da norma a pagar o imposto;
Então, você, cidadão, nunca peça por mais impostos, e também não caia no conto do vigário de que determinado imposto, ou contribuição, será direcionado apenas para determinado setor da sociedade e que visa uma “justiça social”.
A história tem ensinado que ao longo dos anos os tributos têm pesado cada vez mais sobre pessoas e empresas, diminuindo sobremaneira a qualidade de vida daquelas, pois retira delas a disponibilidade financeira que poderia ser melhor empregada em seu favor por ela mesma, ao invés de ser recolhida para o Estado, órgão centralizado que não tem condições de decidir melhor do que o próprio cidadão na alocação dos próprios recursos, isso sem mencionar no desperdício natural da máquina pública quando na prestação de serviços.
Uma menor carga tributária é o melhor caminho para melhorar a qualidade de vida das pessoas, pois elas terão maior disponibilidade financeira para investir nela próprias ou em negócios próprios, fomentando, dessa forma, a economia do país.
Lembre-se, menos tributos, mais qualidade de vida para as pessoas.
[1] Art.31. Fica instituído o imposto geral sobre a renda, que será devido, annualmente, por toda a pessoa physica ou juridica, residente no territorio do paiz, e incidirá, em cada caso, sobre o conjunto liquido dos rendimentos de qualquer origem.
[2] Art. 1º. São tributaveis os rendimentos produzidos no territorio nacional e derivados das seguintes origens:
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