Blog

  • Rússia aprova lei para uso de criptos em transações internacionais: liberdade total?

    Rússia aprova lei para uso de criptos em transações internacionais: liberdade total?

                Após o início do conflito entre Rússia e Ucrânia, iniciado por aquela, que insiste em não classificar o ato como guerra, a Rússia vem sofrendo sanções de diversos países do ocidente. Isso a fez se aproximar mais da China, Índia e Turquia para a realizações de transações comerciais.

                O uso do sistema SWIFT pela Rússia não é mais possível, diante das sanções. Recentemente, no final de julho de 2024, o Estado russo aprovou legislação para regulamentar o uso de criptomoedas em transações financeiras internacionais. As criptos estarão sujeitas aos mesmos regulamentos que moedas estrangeiras.

                A chamada legalização do uso de criptomoedas para transações financeiras internacionais não é ampla e irrestrita, como se pode entender das chamadas em diversos canais de notícias. A regulamentação da liberação para o uso é restritiva, mencionando que o banco central da Rússia será o órgão competente para autorizar empresas selecionadas para realizar liquidações internacionais e negociações de câmbio em criptoativos.

                A previsão de início de vigência da lei é 1º de setembro de 2024.

                A Rússia também regulamentou outro tema relacionado com o mundo das criptomoedas, que é a mineração desses ativos. A mineração poderá ser feita no território russo a partir de 1º de novembro de 2024.

                A legislação relacionada proibiu o anúncio de criptomoedas que vise oferecer o produto a um número ilimitado de interessados.

                Pode-se concluir, pela forma da regulamentação, que a Rússia não está facilitando o uso de criptomoedas por todas as empresa e pessoas, o que poderia gerar um ambiente favorável para o desenvolvimento e crescimento da economia cripto.

    A regulamentação visa ajudar o Estado russo a, com o auxílio de empresas selecionadas, continuar a efetuar transações internacionais fora do sistema financeiro mundial, utilizando, para isso, de forma oficializada, criptomoedas. Não visa, ao contrário do aparentemente alardeado pela imprensa, de uma legalização e autorização ampla para o uso de criptomoedas por toda e qualquer empresa ou cidadão.

                A mineração, antes perseguida, será permitida, debaixo de condicionantes que serão expedidos por órgão com competência legal para tanto, tendo o banco central russo papel de relevo no direcionamento e controle da aplicação da regulação.

                Aguardemos para verificar, com o passar do tempo, se a regulação do uso das criptomoedas manterá esse formato mais restritivo, ou se haverá alguma tendência de ampliação do uso com a diminuição das limitações.

                No que você apostaria, caro leitor, em termos de tendência nesse setor na Rússia? E no resto do mundo? Deixe a sua opinião nos comentários.

    Links fontes:

    https://portaldobitcoin.uol.com.br/russia-quer-escapar-de-sancoes-ao-legalizar-criptomoedas-para-transacoes-internacionais/

    https://www.coindesk.com/pt-br/policy/2024/07/30/russia-legalizes-crypto-mining-and-brings-an-experimental-regime/#:~:text=A%20R%C3%BAssia%20aprovou%20uma%20lei,moeda%20digital%20tamb%C3%A9m%20foi%20aprovada.

  • O uso e porte de drogas ficou liberado com a decisão do Supremo?

    O uso e porte de drogas ficou liberado com a decisão do Supremo?

                Tem repercutido na mídia a notícia do julgamento do Supremo Tribunal Federal, ocorrido em junho de 2024, que teria liberado o consumo de drogas no território nacional.

                O uso e porte de drogas foi liberado no Brasil pelo Supremo?

                Trata-se do julgamento do Recurso Extraordinário 635659, com repercussão geral, que gerou o Tema 506.

                A controvérsia abarcou a aplicação do art. 28 da Lei n 11.343/2006 (Lei de Drogas), que tem penas alternativas para a compra, porte, transporte ou guarda e drogas para consumo pessoal. Também estão sujeitos às mesmas penas quem semear, cultivar ou colher plantas destinadas à preparação de pequena quantidade de produtos ou substâncias capazes de causar dependência física ou psíquica.

                A Corte declarou, por maioria, inconstitucional, sem redução de texto, enquadrar como crime apenas o porte de maconha para uso pessoal.

                Ficou estabelecido, pelo STF, que até 40 gramas de maconha podem ser portados pelo usuário sem ser considerado crime, desde que as demais circunstâncias não apontem para a possibilidade de tráfico de entorpecente. Ficou estabelecido, ainda, pela Corte Suprema, que é possível cultivar até 6 plantas-fêmeas para uso próprio.

                Eis os principais pontos da decisão do STF sobre a posse de drogas:

    • O STF descriminalizou o porte de até 40 gramas ou a plantação de seis plantas-fêmeas de cannabis sativa para uso pessoal.
    • Adquirir, guardar, ter em depósito, transportar ou trazer consigo, a maconha para uso pessoal, deixou de ser considerado um crime e passa a ser uma infração administrativa, com consequências mais brandas como advertência sobre os efeitos das drogas, medida educativa de comparecimento a cursos, e outras sanções administrativas, porém não mais estará submetido à pena de prisão ou prestação de serviços à comunidade.
    • A decisão não legalizou o consumo de maconha, que ainda é proibido. A polícia poderá abordar e apreender a droga de quem a estiver portando, mas não haverá mais punição criminal.
    • O STF definiu a quantidade de quarenta gramas como parâmetro para diferenciar usuário de traficante. Essa quantidade valerá até que o Congresso Nacional legisle sobre o tema.
    • Usuários não mais poderão ser submetidos à pena de prestação de serviços à comunidade, que é considerada uma sanção de natureza penal. Apenas medidas administrativas poderão ser aplicadas.
    • O STF vedou o contingenciamento do Fundo Nacional Antidrogas e determinou que parte dos recursos seja usada em campanhas educativas sobre o uso de drogas.

                Como ficou acima elencado, o STF descriminalizou o porte de maconha para uso pessoal, mas manteve a proibição do consumo em público e a possibilidade de apreensão da droga pela polícia.

                Importante destacar que a presunção prevista no julgado do STF é relativa, podendo a autoridade policial e seus agentes efetivar a prisão em flagrante por tráfico de drogas, mesmo para quantidades inferiores ao limite estabelecido no julgado, “quando presentes elementos que indiquem intuito de mercancia, tais como a forma de acondicionamento da droga, as circunstâncias da apreensão, a variedade de substâncias apreendidas, a apreensão simultânea de instrumentos como balança, registros de operações comerciais e aparelho celular contendo contatos de usuários ou traficantes”, conforme ficou registrado na decisão proferida pelo Supremo.

                Em ocorrendo essas situações, o delegado de polícia deverá consignar, no auto de prisão em flagrante, justificativa detalhada para afastar a presunção do porte para uso pessoal, estando vedada a alusão a critérios subjetivos arbitrários.

                Um outro ponto importante é que, mesmo que a pessoa for presa por portar quantidade acima da permitida no julgado, o juiz, na audiência de custódia, poderá concluir que a conduta é atípica, apontando nos autos prova suficiente da condição de usuário.

                Esses são os principais pontos da decisão do STF sobre o porte de maconha para uso pessoal. Com essa leitura, espera-se informar as pessoas sobre os limites da decisão, afastando muita especulação e interpretações errôneas disponíveis na internet e nas redes sociais.

    Link para o acesso à integra da decisão: Supremo Tribunal Federal (stf.jus.br)

  • As cheias do Rio Grande do Sul ameaçam também a sobrevivência da liberdade de expressão?

    As cheias do Rio Grande do Sul ameaçam também a sobrevivência da liberdade de expressão?

                Tenho observado, após os primeiros dias do desastre ocorrido no Rio Grande do Sul, vozes[1], sobretudo de outros Estados da federação, ressurgindo em coro e apresentando como solução para as ditas fake news a regulação da internet, mais precisamente das redes sociais. As vozes que ecoam a necessidade da aludida regulação afirmam que as notícias consideradas, por elas, mentirosas, atrapalham o esforço no resgate das vítimas. Além de mencionar a necessidade regulatória, enfatizam que tal regulação precisa ser feita imediatamente.

                Preocupa-me o apelo à emoção para tratar de assunto sensível e importante para a sociedade civil. A emoção faz parte do nosso dia a dia, porém não devemos agir baseados apenas nela. Devemos, sobretudo, agirmos de forma racional, tanto como indivíduo, quanto como sociedade. E a razão orienta a analisar os fatos e as circunstâncias com cautela, observando detidamente os prós e os contras de qualquer proposta de lei. E, em relação à eventual proposta de lei sobre a limitação do direito fundamental de expressão do pensamento e/ou dos fatos, o cuidado deve ser redobrado, pois corre-se o risco de criação de monopólio na transmissão das notícias. E isso não é desejável para a sociedade que pretende permanecer democrática.

                Apesar da grande maioria utilizar a internet diariamente, pouquíssimos conseguem constatar a grande utilidade desse instrumento como facilitador na troca de informações entre as pessoas. Através dessa rede, milhões de pessoas trocam mensagens diariamente e têm acesso às notícias de várias partes do mundo de forma descentralizada e distribuída, sem depender exclusivamente das tradicionais redes de comunicação (televisão e rádio). Quantos canais de televisão aberta tem o Brasil? Lembro-me de uns quatro apenas. Quantos blogs, canais do Youtube, perfis no X.com, Instagram, há? Milhares, e a cada momento podem surgir vários outros.

                Quantas realidades só nos chegam porque alguém, possuindo um simples celular nas mãos, dispõe-se a registrar os fatos e a transmiti-los na internet para quem quiser ver? Milhares. Antes da internet, e mormente das redes sociais, só tínhamos acesso aos fatos e às realidades após a filtragem dos canais tradicionais de comunicação. O que você prefere, a primeira ou a segunda situação?

                Em relação à resposta estatal ao desastre ocorrido no Rio Grande do Sul, não foram as notícias divulgadas pelas redes sociais que causaram a dificuldade na resposta estatal, mas sim a falta[2] de coordenação prévia do aparato estatal, nas três esferas. A internet apenas desvelou o acontecimento e as pessoas puderam tomar conhecimento da realidade daqueles locais, mesmo morando longe. A rede mundial de computadores também permitiu que as pessoas diretamente atingidas pelo evento pudessem expressar as suas dores e os seus pedidos de socorro, que, sem a internet, permaneceriam inaudíveis, ou as ondas de som desses pedidos sofreriam refração nos meios oficiais e chegariam modificados aos ouvintes finais.

                Se você pretende continuar tendo uma certa liberdade de expressão na internet, que pode ser considerada a ágora do Século XXI, pense bem antes de aderir ao movimento de manada que conclama uma regulação restritiva das redes sociais e demais plataformas hospedadas na internet. É importante saber compreender bem as palavras proferidas nos brados por regulação das mídias digitais. Regular não significa necessariamente impedir o cometimento de crimes, mas sim a limitação da liberdade de expressão das pessoas, inclusive daquelas que não cometeram crime.

                A legislação já pune quem comete crimes na internet, não necessitando de mais normas para tanto. Então, pense bem, se já há legislação para punir quem colete ilícitos penais e civis através da internet, então, para que a insistência na regulação das redes sociais? Sei que você, leitor, é uma pessoa inteligente, mas, mesmo assim, direi para que serviria uma regulação das mídias digitais: para limitar a pouca liberdade de expressão que eu e você temos.

                O melhor ambiente para se combater inverdades, ou, conforme expressão da moda, fake news, é a livre circulação de notícias. Com o livre trânsito dessas, os fatos verdadeiros, quando confrontados, acabam prevalecendo no “mercado” das trocas voluntárias de notícias[3] realizado entre as pessoas. Limitar ou proibir a divulgação não ajuda na busca da verdade, mas favorece aquele que for escolhido, pela lei, como fonte oficial de veiculação de “notícias” e o ente ou entidade beneficiada pela aludida “notícia”. Lei essa que será fruto do poder de pressão de quem de fato detém o poder. E parece que o poder emana do povo apenas na letra fria da Constituição brasileira, sem encontrar amparo na realidade factual.

                Se você estiver pensando agora em como ficará a pessoa que, de forma intencional, cria e propala inverdades, não se preocupe. Já há instrumentos legais para essa pessoa responder pelos ilícitos, tanto na esfera penal quanto na cível. Quem se sentir prejudicado por alguma publicação, poderá, através de processo judicial, com garantia ao contraditório e à ampla defesa, pleitear a remoção da publicação e a reparação dos danos.

                Desta forma, precisamos ter cuidado para não estarmos agindo sob o efeito manada e pedindo por algo que possa resultar em um instrumento de controle e de diminuição da nossa liberdade de expressão, sob a promessa de combate às fake news. A liberdade de expressão, uma vez perdida, é muito difícil de recuperar. Não se esqueça disso antes de cogitar em aderir a algum movimento regulatório da liberdade de expressão.


    [1] Autoridades públicas e integrantes da imprensa.

    [2] Ou coordenação ineficiente.

    [3] Envio e recebimento de notícias/informação sobre fatos.

  • O imposto do pecado: o que é isso?

    O imposto do pecado: o que é isso?

                A reforma tributária, cuja regulamentação foi enviada para a Câmara dos Deputados em 25/04/2024 pelo Poder Executivo federal, está tramitando sob a rubrica PLP 68/24[1]. Nela há algo pitoresco para a população, que ficou conhecido como “imposto do pecado”. Trata-se do Imposto Seletivo – IS, previsto a partir do art. 393 do PLP 68/24.

                Aqui está inserida a ideia de extrafiscalidade do tributo, pois, segundo a doutrina do Direito Tributário, o tributo pode ter, além do aspecto meramente fiscal, o elemento extrafiscal, ou seja, que vai além da função arrecadatória, induzindo comportamentos nos agentes econômicos. Por exemplo, se a entidade tributante pretende fomentar o consumo de determinado produto, pode diminuir a alíquota.

                O caput do art. 393 do aludido projeto de lei complementar prevê que incidirá o IS sobre a “produção, extração, comercialização ou importação de bens prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente”.

                E quais os bens prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente? Para o PLP 68/24, são considerados bens prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente aqueles classificados nos códigos da NCM/SH contemplados no Anexo XVIII, relativos a “veículos, embarcações e aeronaves, produtos fumígenos[2], bebidas alcoólicas, bebidas açucaradas e bens minerais extraídos”.

                A escolha dos bens considerados prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente é arbitrária, resultado da opção do proponente do PLP 68/24, que será convalidada ou não pelo Poder Legislativo federal. Nos debates legislativos, outros itens poderão ser acrescentados[3] ou retirados, a depender da movimentação dos grupos de interesse e da capacidade de articulação desses. Você, estimado leitor, como não tem capacidade de exercer lobby junto ao Congresso Nacional, não será ouvido pelos ditos “representantes do povo”.

                O que eu gostaria de chamar a atenção neste momento não é a efetividade do aspecto extrafiscal do tributo, se é realmente capaz de desincentivar o consumo de determinados produtos, a exemplo das bebidas alcoólicas, pelas pessoas, com a incidência do Imposto Seletivo. Mas sim de questionar o poder que o Estado tem de intervir no comportamento das pessoas através do sistema tributário.

                A ideia subjacente aqui, no aspecto extrafiscal do tributo, é que o povo, que em teoria é o titular do poder, já que de acordo com o art. 1º da Constituição Federal, o poder emana daquele, precisa de um tutor legal, pois não é capaz de decidir como deve utilizar o seu dinheiro no momento da compra de um produto/bem. Sim, isso mesmo, você, estimado leitor, não teria o discernimento necessário quando consome um produto, necessitando, desta forma, da orientação do Estado para que consuma, em maior parte, produtos benéficos para a saúde e para o meio ambiente, pela ótica da entidade estatal.

                Não lhe parece contraditório isso? O povo, do qual o poder emana, precisa ser tutelado pelos seus representantes, que escolherão, por algum critério, o que pode ou não consumir[4]? Para mim, parece bastante contraditório e inconveniente. Isso demonstra que a cada dia que passa, nós, o povo, temos menos liberdade de escolha. A esfera individual de liberdades está ficando a cada dia menor, tendente a desparecer em nome do denominado bem comum, o qual mais se aproxima dos interesses dos representantes do que do representado, o povo brasileiro.

                Além do mencionado acima, ainda há um outro aspecto que impacta diretamente a sua vida, mesmo que você não venha a consumir os produtos considerados danosos à saúde e ao meio ambiente. Perceba que, além do IS, o consumidor ainda pagará o IVA dual, resultando sim em um aumento da carga tributária. E quanto maior a carga tributária, menor a possibilidade de recuperação da economia e de crescimento econômico do país de forma sustentável, o que impacta negativamente a maior parte da população brasileira.

                Se você caminhar na sua cidade, perceberá que grande parte da população só tem recursos financeiros suficientes para adquirir os produtos processados ou ultraprocessados, já que o acesso a uma alimentação saudável está cada vez mais distantes de grande parte da parcela da população brasileira, em razão do aumento de preço resultando da inflação[5]. É verdade que alimentos industrializados ainda não estão na lista de incidência, porém podem ser inseridos a qualquer momento. Destarte, qualquer aumento fiscal em alimentos processados e ultraprocessados prejudicará a parcela da população que, infelizmente, só tem acesso a esse tipo de alimento. Essa parcela da população trocará o alimento ultraprocessado por um mais saudável? Não, ela consumirá o mesmo alimento considerado prejudicial à saúde, porém em uma quantidade menor, já que não conseguirá comprar a mesma quantidade de antes. O mesmo se aplica às bebidas alcoólicas. O pobre será penalizado quando comprar a sua cerveja ou pinga para o seu momento de lazer. Momento esse cada vez mais difícil.

                O aumento da carga tributária alimenta um ciclo vicioso cruel. Quanto mais se eleva a carga tributária, o país cresce menos e, com menor crescimento há menos geração de riqueza, o que impede ou diminui os investimentos produtivos, gerando, por conseguinte, menos emprego e menos oportunidades para os pequenos empreendedores, que não têm como se manter no mercado quando a carga tributária inviabiliza o seu negócio. Assim, faça um esforço e comece a prestar a atenção em quanto você paga de tributo no seu dia a dia. Talvez assim você comece a entender o quão pernicioso é o nosso sistema tributário. E aí, o que você acha do fato de ter alguém que escolha por você o que é prejudicial à sua saúde?


    [1] Projeto de Lei Complementar 68/24.

    [2] De acordo com o dicionário on line Dicio, fumígeno é algo “concebido para produzir fumaça”.

    [3] Nada impede que o Congresso Nacional insira nessa lista alimentos industrializados.

    [4] Interessante observar que há imunidade do Imposto Seletivo nos serviços de transporte público coletivo de passageiros rodoviário e metroviário urbano, semiburbano e metropolitano (art. 398, II, b, do PLP 68/24). Esses transportes não seriam, em alguma medida, prejudiciais ao meio ambiente? Imunidade total passa a ideia de que não são, em nenhuma medida, prejudiciais ao meio ambiente, o que não é verdade.

    [5] Inflação aqui considerada como o aumento da base monetária em volume maior do que a oferta de bens e serviços no mercado.

  • Caso Joca. Casuísmo legislativo?

    Caso Joca. Casuísmo legislativo?

    Foi bastante noticiado o caso da morte de um animal de estimação de nome Joca nos últimos dias. Por erro da companhia aérea, o cão foi enviado para a cidade de Fortaleza, no Ceará, quando deveria ter sido transportado para a cidade de Sinop, no Mato Grosso.

    Trata-se de um vício no fornecimento do serviço, pelo qual a companhia aérea responde pelos danos causados, de acordo com o art. 14, caput, do Código de Defesa do Consumidor. A responsabilidade é objetiva, ou seja, não é necessária a prova da culpa (impruduência, imperícia ou negligência), bastando demonstrar o dano provocado pelo agente (no caso mencionado, a companhia aérea) e o nexo causal.

    A responsabilidade objetiva, na seara do consumidor, decorre da assunção dos riscos inerentes à atividade econômica desenvolvida pela pessoa (física ou jurídica).

    Em termos de responsabilidade objetiva, na área consumerista, o ordenamento jurídico brasileiro está completo, não precisando de novos diplomas legais.

    Em relação ao caso Joca, como ficou conhecido, os parlamentares federais aproveitaram o ocorrido para apresentar pelo menos 7 (sete) projetos de lei. No Brasil, infelizmente, muitos têm a ideia de que o parlamentar só faz algo se apresentar projetos de lei. Então, para “ganhar pontos” com o eleitorado, os parlamentares costumam aproveitar o hype para vender a ideia de que são atuantes e que os projetos por eles apresentados evitarão, de uma vez por todas, que casos similares se repitam. Costumo chamar isso de populismo legislativo.

    Repito. Hoje, o Código de Defesa do Consumidor já é suficiente para responsabilizar a companhia aérea que causou o dano ao proprietário do cahorro. E, em tese[1], havendo previsão legal de responsabilização civil, através do pagamento de indenização, todas as companhias aéreas buscarão prestar o serviço da melhor forma possível, evitando os vícios na prestação, e, por conseguinte, de ter de pagar a reparaçao civil correspondente.

    Lamentável o ocorrido, tanto pelo animal que morreu em decorrência do serviço mal prestado pela Gol, quanto pelo dono do Joca, que sofreu abalos morais pela morte do seu animal de estimação.

    Entretanto, é preciso cautela [2] na elaboração de legislação sobre o transporte de animais em aeronaves. Aquela não pode ser elaborada de forma emocional e apenas para melhorar a imagem midiática do parlamentar proponente da lei.

    As leis produzem resultados no mundo dos fatos. A esses resultados os economistas chamam de externalidades, que podem ser positivas ou negativas. Deve-se buscar elaborar diplomas legais que produzam mais resultado positivo do que negativo. Caso contrário, o ideal é que não se insira no ordenamento jurídico uma norma que irá piorar a situação.

    Pelo que foi mencionado na internet pelos meios de comunicação, os projetos de lei apresentam propostas com medidas de segurança a serem adotadas pelas companhias aéreas, o que pode aumentar o custo do transporte dos animais. As perguntas que devem ser feitas no debate dos projetos são as seguintes: essas mudanças efetivamente aumentam a segurança no transporte para os animais? Ou irá apenas aumentar o custo do transporte sem um resultado positivo concreto no incremento do grau de segurança?

    Nunca é demais repetir que a lei, por si só, não tem o condão de resolver os problemas mencionados nas suas justificativas. Quando mal elaborada, a lei não só não resolverá o problema, mas poderá gerar outros, além de aumento de custos. Ademais, esses custos podem ser suportados apenas por quem usar o serviço de transporte de animais, como também poderão ser suportados por todos os usuários do transporte aéreo, sem que o passageiro tenha utilizado o serviço de transporte aludido.

    Assim, antes de pedir por uma nova lei, ou de apoiar um novo projeto de lei, procure verificar primeiro, se a lei é realmente necessária; segundo, se ela trará resultado positivo. Caso a resposta para a primeira pergunta seja negativa, a segunda perde o objeto. Se a resposta para a primeira pergunta for afirmativa, a segunda pergunta precisa ser feita com seriedade e efetivamente buscando uma resposta que reflita a realidade dos efeitos potenciais da norma proposta.

    Lembre-se, a emoção pura, sem o uso da razão, não costuma ser uma boa conselheira. Isso se aplica em tudo na vida, em especial na elaboração de lei, que pelo seu caráter erga omnes, tem o potencial de afetar vários grupos de pessoas.

    [1] Em tese, pois a lei não tem a capacidade, pela simples existência, de evitar atos/comportamentos das pessoas, mas tem o potencial, pela previsão de responsabilidade e pela possibilidade de aplicação real e efetiva aos casos, de induzir comportamentos que evitem danos, e por consequência, a obrigação de reparará-los.

    [2] Aplica-se à proposta de lei sobre qualquer matéria.

  • A escravidão que poucos percebem

    A escravidão que poucos percebem

                A escravidão foi abolida no Brasil em 13 de maio de 1888 pela Lei Áurea, assinada pela princesa Isabel. O Brasil foi o último país a abolir a escravidão da população negra no ocidente.

                Aprendemos nos bancos escolares e universitários que a partir daquele momento a escravidão foi abolida. Será isso verdade? Em parte, sim. Porém, hoje no Brasil existe uma escravidão que poucos percebem, silenciosa e que aprisiona grande parte da população, inclusive você que está lendo este texto.

                Neste momento você, leitor, deve estar discordando da minha afirmação, pois, como todos aprendemos, desde 13 de maio de 1888 não existe escravidão no território nacional. Entretanto, tenha calma na discordância e leia o texto até o final. Talvez você comece a perceber aquilo que não percebeu até hoje: que você é um escravo.

                E quem seria o senhor do escravo brasileiro moderno? Aqueles que realmente detêm o poder e o exercem através do Estado, como descrito por Léon Duguit[1] na sua obra de Teoria Geral do Estado. E como se dá essa escravidão? Essa deve ser a pergunta que deveria estar tomando conta dos seus pensamentos.

                A escravidão atual se dá através da tributação. É através da atividade estatal denominada tributação que é possível limitar a sua liberdade, porque, quanto menos recurso financeiro fica disponível para o cidadão, menos liberdade efetiva e concreta ele terá. E isso ocorre de forma sorrateira e silenciosa, sem que as pessoas percebam esse processo de limitação da liberdade.

                A reforma tributária iniciada em 2023, com a promulgação da Emenda Constitucional nº 132, de 20 de dezembro, infligirá, aos contribuintes brasileiros, uma das maiores cargas tributárias, quiçá a maior, sobre bens e serviços. Perceba que o problema ainda poderá piorar, pois essa é apenas a primeira fase da malfadada reforma tributária.

                Há pouco dias (25/04/2028), o ministro da fazenda, Haddad, entregou a proposta do governo que regulamenta a reforma tributária. Na Câmara dos Deputados recebeu a seguinte numeração: Projeto de Lei Complementar – PLP 68/24.

                Os defensores da reforma tributária afirmavam, ao vender e defender a referida reforma ao longo do ano de 2023, que essa iria simplificar o sistema tributário nacional, trazendo “benefícios” para todos. Porém, não é surpresa constatar que agora, com o envio do projeto de lei complementar, que não haverá sequer a prometida simplificação do sistema tributário brasileiro. O mencionado projeto tem 499 artigos e continuará a exigir dos contribuintes um esforço de tempo e de dinheiro para cumprir todas as obrigações tributárias.

                Além disso, a carga tributária aumentará consideravelmente para o setor de serviços. Setor esse que mais emprega. Esse incremento na carga tributária do setor de serviços resultará em desemprego e no fechamento de pessoas jurídicas do setor mencionado, agravando ainda mais o problema social.

                A alíquota média prevista do Imposto sobre Valor Agregado – IVA será de 26,5%, mas existe estimativas de que o percentual poderá chegar a 33%, segundo o especialista em contas públicas Felipe Sato, ouvido pelo Correio Braziliense. É um percentual absurdo, que produzirá resultados negativos na economia. Para se ter uma ideia, a média mundial do IVA é de cerca de 15%. Na Ásia é em torno de 12% e na Europa de 20%. Mesmo se a média do IVA brasileiro permanecer na expectativa do governo federal, será superior ao IVA médio da Ásia em cerca de 14,5%, e 6,5% a mais em comparação ao IVA da Europa.

                Meu caro leitor, prepare-se para um aumento da carga tributária. Eis alguns dos motivos para o incremento: primeiro, muitas exceções previstas na reforma tendem a aumentar a alíquota do IVA. Segundo, a criação de fundos para compensar estados e municípios pelas perdas arrecadatórias. Quem vai financiar esses fundos? Você, contribuinte. Terceiro, não há nenhuma sinalização dos governos federal, estaduais e municipais para a redução nos gastos estatais. Então, pela lógica simples, se os gastos estatais não diminuem, impossível a redução na carga tributária. Ao contrário, infelizmente apenas há sinalizações em aumento de gastos, logo, isso resultará em aumento da carga tributária.

                Dessa forma, o desenho apresentado de reforma tributária (perceba que a reforma ainda não foi concluída porque ficaram de fora os tributos sobre propriedade e sobre renda) aponta para um aumento na carga tributária, o que tende apenas a resultados negativos na produção de riquezas e, por consequência, na geração e manutenção dos empregos.

                O resultado é simples e de fácil compreensão. Com o aumento na carga tributária, produtos e serviços ficarão mais caros, com a redução natural no consumo. E, com a redução no consumo, haverá diminuição na produção e fornecimento de bens e serviços, o que resultará, por sua vez, em menos empresas funcionando, redundando também em menos emprego. Isto é, uma reforma tributária que não busca a diminuição na carga tributária e a redução da complexidade do sistema, só produz efeitos negativos (as denominadas externalidades negativas), prejudicando o setor produtivo e os cidadãos. Um país com esse tipo de sistema tributário, que sufoca os contribuintes, não tem um futuro promissor, com redução na produção potencial de riquezas, condenando os cidadãos a se tornarem meros pagadores de tributos, comprometendo quase a totalidade dos seus salários e rendimentos para o adimplemento das obrigações tributárias.

                Então, meu caro leitor, você e eu estamos caminhando para nos tornarmos, a cada dia, menos livres, já que o estado brasileiro insiste, sem qualquer oposição dos cidadãos, em aumentar a sanha arrecadatória, reduzindo os recursos financeiros que permanecem em nossa posse para transferir grande parte do resultado do nosso trabalho para o leviatã insaciável. Com menos recursos financeiros oriundos dos nossos esforços, menos investimentos no nosso progresso podemos fazer e, para muitas famílias, a situação ainda é pior, pois precisam se endividar para cobrir despesas correntes, já que grande parte dos seus recursos foi retirada de forma cogente pelo estado através da tributação.

                Desta forma, com menos recurso financeiro disponível em nossas mãos, menos livres somos. Você ainda duvida que já somos ou estamos todos nos tornando escravos modernos?


    [1] DUGUIT, Léon. Théorie générale de l’État. Le Droit et l’État – Les Libertés publiques. Organisation politique. 3ª ed. Paris : Ancienne Librairie Fontemoing & Cie Éditeurs, 1918.

  • Expectativas aumentam há um dia do quarto halving do Bitcoin.

    Expectativas aumentam há um dia do quarto halving do Bitcoin.

                O quarto halving do Bitcoin está sendo esperado para acontecer entre os dias 19 e 20 de abril de 2024. O evento chamado de halving acontece a cada 210 mil blocos, o que dá em média quatro anos, já que o intervalo de tempo entre cada bloco é de 10 minutos em média.

                No código do Bitcoin está programado que a cada 210 mil blocos a emissão de novas moedas é reduzida pela metade. Assim, quando teve início a mineração, em 3 de janeiro de 2009, a cada bloco eram mineradas 50 unidades. O primeiro halving aconteceu em 28 de novembro de 2012, reduzindo a emissão para 25 unidades. O segundo em 9 de julho de 2016, diminuindo a emissão de novas unidades para 12,5 a cada bloco. O terceiro aconteceu em 11 de maio de 2020, reduzindo a emissão de novas unidades para 6,25 por bloco. Agora, no quarto halving, serão emitidas apenas 3,12 unidades por bloco.

                Com a diminuição da emissão, a inflação monetária da moeda diminui a cada halving, o que costuma ter impacto positivo no ativo ao longo do tempo.

                O Bitcoin, por ser um ativo escasso, somado à diminuição da oferta de novas unidades a cada halving, tende a ter o seu preço aumentando ao longo do tempo em relação à moeda fiduciária, pois a demanda pelo ativo aumenta enquanto a sua oferta é limitada, já que foi programado para ter no máximo 21 milhões de unidades, com a emissão das últimas novas unidades prevista para o ano de 2140.

                Ninguém pode garantir que o comportamento do preço do Bitcoin, no quarto halving, repetirá o padrão dos eventos anteriores, já que agora há novos players no mercado, a exemplo das empresas de gestão de ativos de grande porte, tais como Blockrock, Fidelity, Valkyrie, WisdomTree, VanEck, Invesco e Galaxy, Grayscale, ARK Invest e 21Shares.

                Porém, pelas características do ativo, que são a escassez, a descentralização, a distribuição da blockchain por milhares de nodes situados em diversas localidades do mundo, e a incapacidade dos governos de bloquearem o ativo na blockchain, a busca pelo ativo tende a ser crescente ao longo dos anos, especialmente pela perda da confiança no dólar americano que vem se agravando nos últimos anos.

                Tudo indica que o Bitcoin está se tornando um ativo consolidado, apesar de existir há apenas 15 anos, despertando o interesse dos agentes do mercado financeiro tradicional. No Brasil, o Banco do Brasil apareceu, nos últimos dias, como um grande comprador do ETF spot emitido pela gestora Blackrock, nos Estados Unidos. Quem antes desdenhava do potencial da moeda eletrônica, agora está alocando parcela dos ativos dos seus clientes nos ETFs, em uma movimentação visando a preservação do patrimônio frente à inflação, já que o Bitcoin é o único ativo existente que não é inflacionário.

                Acompanhemos o comportamento do Bitcoin após o quarto halving. O que parece consenso no mercado é a valorização futura e contínua do ativo em relação às moedas fiduciárias, mormente pelo fato dessas estarem sendo emitidas em grande escala pelos governos para pagar as suas obrigações, inflacionando a oferta monetária, tendo como consequência a perda do poder de compra da moeda.

  • Polícia pode pedir compartilhamento de dados ao Coaf sem autorização judicial prévia?

    Polícia pode pedir compartilhamento de dados ao Coaf sem autorização judicial prévia?

    A pergunta acima formulada costuma ser feita com frequência quando se trata de situação em que a polícia requer, diretamente ao Conselho de Controle de Atividades Financeiras – Coaf, o compartilhamento de relatórios de inteligência financeira, sem prévia autorização judicial.

    A Reclamação 61944 questionava justamente isso e teve o seu julgamento realizado pela 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal – STF, em 02/04/2024.

    A 1ª Turma do STF decidiu, por unanimidade, rejeitar a reclamação, mantendo entendimento de que a polícia judiciária pode requerer, diretamente ao COAF e sem autorização prévia judicial, o compartilhamento de relatórios de inteligência financeira.

    Na Reclamação 61944, o Ministétio Público do Estado do Pará questionava decisão proferida pelo Superior Tribunal de Justiça – STJ que acolhera recurso em habeas corpus apresentado pela defesa de um dirigente da sociedade empresarial Cerpa Cervejaria Paraense S.A., de Belém do Pará, investigado por suposta prática do delito de crime de lavagem de dinheiro. Para o STJ, o compartilhamento de informações de inteligência financeira só seria válido se a iniciativa do compartilhamento fosse do Coaf, e não da polícia.

    De acordo com o relator da Reclamação aludida, o Min. Zanin, o STJ teria interpretado de forma equivocada o Tema 990 do STF, que autoriza tanto o compartilhamento provocado quanto o espontâneo.

    Tema 990 do STF:

    “Possibilidade de compartilhamento com o Ministério Público, para fins penais, dos dados bancários e fiscais do contribuinte, obtidos pela Receita Federal no legítimo exercício de seu dever de fiscalizar, sem autorização prévia do Poder Judiciário”.

    Reclamação 61944íntegra da decisão.

    Fonte da informação: site do STF.

  • Prazos suspensos no STF em razão da Semana Santa

    Prazos suspensos no STF em razão da Semana Santa

    Em virtude do feriado da Semana Santa, não haverá expediente na Secretaria do Tribunal nos dias 27 a 29 de março, conforme prevê o artigo 62, inciso II da Lei 5.010/1966, que define os feriados na Justiça Federal e nos tribunais superiores. A determinação foi publicada na Portaria 325, de 29 de dezembro de 2023, editada pela Diretoria-Geral do Supremo Tribunal Federal.

    Assim, os prazos processuais que se iniciam ou se encerram nesses dias serão automaticamente prorrogados para a segunda-feira subsequente, dia 1° de abril, seguindo previsão dos artigos 219 e 224, parágrafo 1º, do Código de Processo Civil (Lei 13.105/2015). 

    P.S.: texto acima extraído do site do STF, no link seguinte: https://portal.stf.jus.br/noticias/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=530851&ori=1

    27/03/2024

  • Existe porte ilegal de arma de fogo que não funciona?

    Existe porte ilegal de arma de fogo que não funciona?

    A Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal decidiu, de forma unânime, absolver um indivíduo acusado de porte ilegal de arma, após constatar que a arma apreendida era inoperante e incapaz de disparar. Esse fato fez com que a acusação fosse considerada inadequada, já que a arma se enquadrava mais como um simulacro ou artefato obsoleto, não constituindo crime seu porte. Esta decisão se baseou em entendimentos jurídicos que distinguem entre armas efetivamente perigosas e aquelas sem capacidade de uso, ressaltando a importância da funcionalidade da arma para a configuração do crime de porte ilegal.

    Num caso avaliado pela Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, foi determinada a absolvição de um indivíduo acusado de portar ilegalmente uma arma de fogo, devido à comprovação de que tal arma, de fato, não possuía condições de funcionamento. A perícia oficial evidenciou a incapacidade do revólver em disparar, classificando-o, assim, mais como um objeto inofensivo do que como uma ameaça real. Esse julgamento, centrado no Habeas Corpus 227219, reflete a perspectiva de que a ilegalidade do porte de arma depende da capacidade de uso da mesma.

    A condenação inicial do réu por porte ilegal de arma, associada ao tráfico de drogas, foi questionada até chegar ao STF, fundamentada na ineficiência demonstrada do armamento. André Mendonça, ministro relator, argumentou que, dada a inoperância comprovada da arma e munição, classificar o objeto como arma de fogo contradizia a legislação vigente. Ele destacou a distinção legal entre tentativas de crime com meios ineficazes e o porte de itens incapazes de cometer o delito, sublinhando a não equivalência com armas desmontadas ou sem munição, as quais, em teoria, poderiam ser reativadas para uso.

    Portanto, segundo o ministro relator, seria um erro classificar o objeto em questão como uma arma de fogo, conforme definido pelo Decreto 10.030/2019, que regulamenta o Estatuto do Desarmamento. Isso se deve ao fato de que a definição de arma de fogo implica na capacidade de disparar projéteis. Mendonça enfatizou que, conforme o artigo 17 do Código Penal, não se pune a tentativa quando, por ineficácia absoluta do meio ou por absoluta impropriedade do objeto, é impossível consumar-se o crime, como ocorreu no caso julgado.

    O ministro destacou que o caso não se compara ao porte de uma arma sem munição ou desmontada. Nesses cenários, mesmo que o uso imediato seja impossível, o objeto ainda se classifica como uma arma de fogo, podendo, se montada ou recarregada, funcionar e atingir seu propósito.

    Processo relacionado: HC 227219